sábado, 29 de janeiro de 2011

NAS CORES INVISÍVEIS



Vamos ler aqueles poemas que ainda não foram escritos, e vamos escrever o nosso próprio poema, sem versos. Sejamos o verso um do outro. Sejamos amor frente e verso.

Vamos fazer barulho no nosso silêncio, de um jeito que só a gente entenda. Vamos cantar uma canção inaudível. Vamos pronunciar a melodia de ser calado. E vamos amar assim, calados. Colados. À meia luz.


Vamos tocar o infinito. Vamos ser eternos, apenas por hoje. Vamos percorrer o mundo dentro do menor cômodo. Dentro de nós.


Você vê no que nos transformamos? Então vem, sejamos senhores de um destino invisível. Vem, que eu te deixo escolher a cor dos nossos sonhos. Vem, que eu te deixo escolher a próxima canção. Vem, que os discos de vinil já não me bastam. Vem, que eu preciso de alguém pra ser meu acorde. Pra entrar em acordo. Pra me acordar.


A minha aquarela precisa das suas cores. Preciso esbarrar em seus tons pra me sentir inteira. Assim, nosso caso começa no tom certo. Sem desafinar, fica assim combinado. Passeio por nuances incertos. A incerteza é a minha condição. Nosso encontro é tom sobre tom. Nosso destino é traçado pelas mesmas canetas hidrocor.
..

Minhas filosofias caíram em contradição. Você já sabe dos meus cabelos finos e desgrenhados pelo vento. Já sabe dos meus dedos tornos, dos meus desejos tortos e de todas as outras torturas. Vamos viver esse exato instante em que te digo. Vamos fingir que já nem precisamos do amanhã. Me prometa o futuro mais improvável, só pra eu acreditar.

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

ESPERANDO AVIÕES


ilustração: Börmaister


Houve uma época em que, da janela do meu quarto, eu tinha a chance de analisar largamente o céu. Eu podia ver o entardecer, o anoitecer, o amanhecer. Os fenômenos da natureza se combinavam e se misturavam. Sobre os dias, ficava difícil discernir seus começos e fins. O mais importante era a noite. Era à noite. A noite, à noite, a noite, à noite... Constelações inteiras me presenteavam fora de data. Por parecer estar tão perto do céu, eu me sentia também no direito de ordenar às estrelas que escrevessem o meu destino assim como nos sonhos de menina que vinham me encapar quando eu finalmente pegava no sono. Ali, deitada na minha cama e cheia de sonhos a tira-colo, eu podia ter o mundo em minhas mãos. Eu podia ver o brilho da estrela. Podia me sentir fada. Podia me perder de vista. Podia contar as luas. Pra me encontrar. Ali o tempo voava, assim como voavam os aviões no céu, cujo pouso eu acompanhava delirando até que eles se escondessem no telhado do meu vizinho ou em uma das árvores que transformavam a minha rua em um beco. E, por falar em aviões, antes que eu prolongue ainda mais a introdução como me é de costume, vou começar a contar.

É difícil falar de uma história que não aconteceu. Bem, talvez você não concorde com isso. A verdade é que não é tão complicado imaginar. Eu até que invento bem. Mas, nesse caso, não parece ser tão simples. O fato é que meu conto está entre a verdade e a mentira. Meu conto está entre o real e o imaginário. Não foi tudo obra da minha fértil imaginação, bem sei que não foi. Tenho tudo por escrito para confirmar. Mas, no fundo, nada nunca se concretizou. As nossas palavras costumam aceitar todas as nossas fantasias. Assim, publicamos em nós amores fictícios. Anunciamos ao mundo a beleza dos nossos amores impossíveis, ou mesmo possíveis, porem, inviáveis. Se essa história existiu? Depende do ponto de vista.

Por obra do destino ou do acaso, ele apareceu. Bem, não apareceu da mesma forma com que aparecem os príncipes encantados nas estórias que se conta às crianças antes da hora de dormir. Não veio em cavalo branco, não me conquistou e nem mesmo disse palavras de amor. De fato, meu príncipe nem mesmo tinha cavalo que o pudesse transportar até mim, razão pela qual os aviões se tornaram tão importantes nessa história. Vale a pena contar que, em momento algum, eu fui conquistada com esforço, mas pelo contrário: eu é que tive, neste conto, a árdua tarefa de conquistar. E não foi fácil. Foram minhas as primeiras, segundas e terceiras palavras de amor.
Enquanto tudo acontecia, até pensei ter ouvido, em algum momento, um verso bonito. Mas hoje vejo que, além das primeiras, segundas e terceiras, todas as palavras de amor dessa história foram inteiramente minhas. Pra ser bem sincera, quem veio não era um príncipe. Veio um homem que, aos meus olhos, parecia um menino. Pensando bem, ele nem mesmo veio. Foi de longe, bem longe, que eu me encantei.

Cansada de digitar o que sentia, resolvi começar a gritar. Gritei o quanto pude, pensando que, incomodado com meu barulho infernal, ele se renderia aos meus encantos. O que eu não sabia é que não se encanta ninguém com gritos. Mas, pouco mais tarde, vim a perceber essa fatalidade.

É nessa parte que entram os aviões. Se desde muito antes, quando bem pequena, eu já olhava esses aviões com certa fixação, naquela época passei a ver em cada um deles que completava sua rota perto da minha janela, uma possibilidade de ver o amor de perto.

O tempo passou e os aviões também passaram. Em nenhum deles esteve você. Me invadia o medo de que os anos se passassem e eu questionasse eternamente como teria sido, afinal, a minha história, caso em um daqueles aviões estivesse você e o amor. Você e o amor. Prontos pra fazer inveja em qualquer cidadão. Prontos pra matar de rir. De chorar. De amar. Prontos pra virar tudo de cabeça pra baixo. E eu, morrendo de vontade de ficar totalmente louca, pronta pra me permitir enlouquecer. O medo era de que nenhum dos futuros amores soasse tão leve a ponto de vir do céu e ainda ser bonito. Entende?

Inspirada, motivada e arrastada por esse medo que me ostentava, eu bati na sua porta. Sim, foi quase isso. Bati com o coração na mão. E, por sempre pensar demais, decidi erguer minha mão ao seu encontro sem me questionar, em momento algum, as conseqüências daquela entrega. Entregue ao ponto de, ao contrário do que dizem os dramas do amor, não me equivocar. Um dia virá. E será. Belo.

Até então, ninguém veio me perguntar sobre o amor e outros equívocos. Talvez seja esta a razão de eu continuar amando. E me equivocando. E amando de novo. E me permitindo equivocar-me. E, naturalmente, me equivocando.

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Hoje o Bate-Coração completa seis anos de existência. A música Esperando aviões, do Vander Lee, ilustra não só o texto, mas também este momento.



O tempo passou, mas eu me lembro muito bem: há seis anos atrás, alimentei a doce esperança de entregar, sem maiores pudores, um pouco do melhor que havia em mim. Toda esperança é doce. A verdade é que meus pedaços estão todos espalhados por aqui e, ao contrário do que eu planejei, não só os melhores. Estou inteira nessas linhas. Até nas minhas fantasias, com as quais eu quase te convenço, estou eu. Eu, tentando me sentir completamente dona de mim mesma, sendo dona ao menos das próprias palavras, torcendo pra que você me leia e me aceite, mesmo que não me compreender. A compreensão se torna inútil, se a gente parte do pressuposto de que eu e você nos entendemos bem. Se nossa linguagem é a mesma e se nosso idioma não nos proibe, sinto-me livre para entrar na sua tela, no seu dia, no seu coração. Você é o leitor, entende? Você, que me lê nesse exato momento, é uma das razões desses seis anos de coração batendo forte. É o desejo de ser lida que me torna capaz de articular minhas inspirações em palavras que inspiram quem me lê. Agradeço aos que me leem, me inspiram, me aceitam, me escrevem, me encantam.

O aniversariante é o Bate-Coração, e o meu presente é a batida mais forte, mais sincera e mais profunda que há em mim. O meu convite é continuar escrevendo essa história, sem data de vencimento ou prazo de validade. Enquanto o coração bater (forte)...

domingo, 2 de janeiro de 2011

OS MEUS MOTIVOS

Eu canto porque o instante existe
E a minha vida está completa
Não sou alegre nem sou triste
Sou poeta

(Cecília Meireles)


Os acordes se desprendem da alma. As notas, soltas, me fazem feliz. Claro é o dia em que canto e transformo em poesia aquilo que já não cabe em mim. Vou soltar a minha voz. E, você, por favor, entenda.



Esse é o clipe de divulgação da música Mil Planos, que é de composição de Raphael Campos. Mil Planos é uma das faixas do meu disco, a primeira a ser divulgada na internet. O CD está quase pronto e se chama "de caneta hidrocor". Espero que vocês, leitores queridos do Bate-Coração, cantem comigo essa canção. Que o coração bata mais forte agora e sempre. E que, em 2011, a minha música colora o som de muita gente por aí... de caneta hidrocor!



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