Nós, as mulheres.
Nós e nossa obesidade imaginária. Nossos dias no mês de
tensão perpétua. Nosso sexto sentido e todos os outros sentidos além da conta.
E, em nome deles, nossa quase mania de perseguição. Nossas intrigas
disfarçadas. Nosso desejo extravasado de autonomia e autenticidade. Nossa
vontade absurda de ser quem somos, doa a quem doer, se contrapondo ao nosso
desejo profundo de mudar tudo do dia para a noite. Nossa vaidade lutando no
espelho contra algumas inseguranças tolas. Nossas explosões repentinas. Nossos
desejos comprimidos por conveniência. Nosso lado que se esqueceu de virar
mulher ameaçando nosso salto alto. Nossas franjas, nossos sorrisos, nossas
bolsas de segredos inconfessáveis. Nossas agendas que marcam encontros,
consultas e frases bonitas. Nós e cada uma de nossas compulsões. Nossos amores
platônicos implorando, dentro de nós, pra que ninguém venha nos lembrar de que
a realidade existe, insiste, persiste. Nosso mundo da lua. Nossa vida real.
Nosso cotidiano, nossas mentiras, nossas verdades e todo o resto. Todo o nosso
resto e tudo o que sobra depois do final de cada dia. Toda mulher é várias.