Porque a ausência, essa ausência assimilada,
ninguém a rouba mais de mim.
(Carlos Drummond de Andrade)
De uns tempos pra cá,
passei a me sentir dolorosamente conformada quanto à minha condição no mundo.
Estrangeira.
Não é fácil aceitar as
próprias lacunas e assimilar as ausências. Não é simples calar desejos de dias
melhores alimentados por anos a fio. A conformação, pra mim, nunca foi um processo rápido e
muito menos indolor. Mas eu consegui. E compreendi, embora não sem dor, que o
que eu quero não tem nome. E que talvez nem mesmo exista.
Tenho uma coleção de medos
estranhos e autopunições que me rondam. Sou ansiosa, tímida e sedentária. E
mesmo no meio de pessoas intensas e interessantes e inspiradoras, sempre vejo
detalhes que parecem invisíveis. E mesmo envolvida por amores bonitos,
questiono mais do que deveria e cometo uma espécie de autossabotagem. E mesmo
consciente dos desafios a que meus sentimentos exagerados me submetem dia e
noite, ainda me pergunto se estou mesmo conseguindo digerir. Ou me digerir. E
mesmo sabendo da poesia que grita dentro de mim, ainda tenho a ligeira
impressão de que seria melhor calar a inspiração que produz tantas frases
censuradas pela praticidade do mundo.
Mas nada disso me faz
maior, tenha certeza. Não sou intocável, mas sou arisca. Às vezes arranho sem
querer. E me arranho também. E fico assim, em carne viva. Ardendo no toque. Mas não é proposital. É verdade que vivo me comprimindo, mas não é por prazer. É
quase uma tortura interna me aceitar sem dizer tudo o que está por dentro. A
vontade é virar a página e te mostrar o que ainda não foi dito, mas existe
mesmo assim. A vontade é tornar tênue a linha que divide o que está dentro e o
que está fora. Mas parece sempre complicado demais.
Apesar de tudo, sobrevivo feliz. Mas por que ser
tão estrangeira? Por que sempre esperar por algo que está além? Por que insistir em desconstruir o óbvio
e o pré-estabelecido e
o normal e o simples e o que é perfeitamente aceitável? Porque simplesmente não é opcional...