quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

DESEJOS


Que a vida continue me causando espanto, medo, surpresa e prazer. Que o injusto continue me indignando, e que a indignação continue me movendo em busca daquilo que acredito ser certo. Que o meu olhar se mantenha aceso. Que eu continue tendo efêmeras vontades de desistir, porque sou humana, mas que a fé me mova sempre até o fim. Que o caminho árduo nunca me faça ser tentada pelos falsos atalhos. Que, de um jeito ou de outro, a gente consiga viajar: no mapa, nos livros, nos sonhos ou no amor, que é o maior de todos os sonhos. Que sonhar não se torne, em hipótese alguma, tolice. E o melhor: que nenhum sonho jamais seja proibido. Que os planos saiam do papel e nos surpreendam por serem ainda mais bonitos do que pareciam ser quando ocupavam espaço apenas dentro de nós. Que a falta de tempo nunca nos impeça de embrulhar os presentes com papel celofane ou fita de cetim. Que os papeis de carta saiam da gaveta e ganhem letras, redondas ou tortas, que façam sentido quando combinadas pelo coração. Que o encontro nunca deixe de ser a opção mais viável. Que o maior confronto nunca deixe de ser o olho no olho. Que o amor seja finalmente eleito como o caminho mais curto para a real felicidade. Que os dias cinzentos sejam transformados em primavera. Que a gente caiba milimetricamente em um abraço, e que ele nos sirva de esconderijo quando o que está lá fora parecer perigoso demais. Que olhar pra trás jamais nos envergonhe. Que o amor de cinema continue sendo, no fundo, o sonho de cada um. Que declarações sejam feitas sem rodeios. Que as verdades sejam ditas. E que a vida esteja cada vez mais perto da poesia, até que vida e poesia sejam, por fim, inseparáveis. Amém.


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Esse texto foi escrito no final de 2010. Motivada pela repercussão que esses desejos todos me trouxeram, decidi publicar novamente agora, que estamos virando a página de 2011. No fundo, os desejos são os mesmos, não é verdade? Continuamos lutando pelo que acreditamos. E rabiscando nossos planos em agendas. E esperando do próximo ano o que há de melhor. 

Talvez as metas tenham mudado. E até acredito que os caminhos da nossa vida já não sejam os mesmos. Afinal, 365 dias podem sim desviar completamente uma rota. Mas enquanto sonharmos com justiça, esperança, alegria, declaração, poesia e amor... Certamente essas palavras ainda serão capazes de desejar um feliz ano novo.

Palavras não ficam velhas... Então, que 2012 seja doce! Agradeço a todos que acompanharam cada palavra escrita aqui. Aos que vieram de passagem. Aos que seguiram. Aos que deixaram falar a voz do coração na caixa de mensagens. Aos que divulgaram o blog. Aos que nunca se manifestaram, mas leram com carinho cada texto. Enfim, a todos os olhos que percorreram o Bate-Coração. Prometo uma presença ainda maior em 2012. E espero por vocês...

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

ASSIM COMO EDUARDO E MÔNICA


“Quem um dia irá dizer
Que existe razão
Nas coisas feitas pelo coração?”

Lembra daquele amor tão pouco plausível entre Eduardo e Mônica, perfeitamente descrito na música do Renato Russo? Lembra daquele sentimento que pairava no ar sem nenhuma sustentação? Acho que conheço uma história parecida, basta que se invertam os gêneros. Imagine um Eduardo que é como a Mônica de Eduardo e Mônica. Agora pense em uma Mônica que não tem absolutamente nada a ver com a Mônica de Eduardo e Mônica, mas sim com o Eduardo. Entendeu? O fato é que o Eduardo e a Mônica da minha história, assim como o Eduardo e a Mônica de Renato Russo, não tem nada a ver um com o outro. Eu vou te contar.

O Eduardo usa camisetas de bandas de rock, conhece uma porção de músicas cult que apenas 1% da população escuta e, como se não bastasse, ainda toca contrabaixo. Enquanto isso, a Mônica canta alegremente as músicas do Luan Santana que tocam na Liberdade FM e não desliga o rádio enquanto não acaba o refrão.

O Eduardo sabe tudo sobre química, assiste ao National Geographic e é capaz de recitar a história do Brasil, mesmo que lhe peguem desprevenido. A Mônica tem cara de líder de “clube da luluzinha”. Ela compra, mensalmente, a revista Capricho e vive atenta às últimas tendências da moda e às cores da estação.

O Eduardo fala inglês fluentemente e, se bobear, até arrisca em italiano. A Mônica confunde ditongos com hiatos e não faz a menor ideia do que seja um agente da passiva. Ele acreditava na teoria da relatividade; ela, no horóscopo do jornal. 

Ele prestaria Biomedicina no final do ano, moraria em uma república com outros mil amigos, entenderia tudo sobre as moléculas orgânicas e inorgânicas e seria feliz assim. Enquanto isso, ela dizia pretender cursar Arquitetura ou Engenharia Civil. Só não sabia, de fato, a diferença entre os dois. Mas ela não seria menos feliz por isso.

Os amigos dele falavam coisas sobre a física moderna e a estequiometria. Juntos, discutiam a política, a politicagem e a politização. Pra ela, tudo era, no fundo, a mesma coisa. No auge das discussões sobre a desigualdade que assola a sociedade brasileira, ela soltava um comentário de três linhas sobre a nova novela das sete. E ninguém dizia mais nada.

“E mesmo com tudo diferente, veio mesmo, de repente
Uma vontade de se ver
E os dois se encontravam todo dia
E a vontade crescia, como tinha de ser”

E mesmo que Eduardo fosse água e Mônica fosse vinho, surgiu entre eles um amor bobinho feito flor que brota em asfalto quente e seco da avenida principal. O amor deles era flor de primavera com cheiro de pólen fora do jardim. Era feito amor de verão, nos trezentos e sessenta e cinco dias do ano.

Ela enrolava os dedos nos cabelos lisos e loiros com olhos de pureza e malícia, ao mesmo tempo. E ele encarava os olhos dela, como se, pra cada segundo, pudesse fazer uma poesia. O amor deles era assim, subjetivo como as tantas figuras de linguagem que a Mônica não sabia como diferenciar. Era metonímia. Era soneto sem rima, drama sem falas, frase sem pontuação. 

“E todo mundo diz que ele completa ela
E vice-versa, que nem feijão com arroz”

E assim eu me pergunto quem é, de fato, feliz nesse mundo: quem rima ou quem perde a razão?

“E quem irá dizer
Que não existe razão?”