quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

ASSIM COMO EDUARDO E MÔNICA


“Quem um dia irá dizer
Que existe razão
Nas coisas feitas pelo coração?”

Lembra daquele amor tão pouco plausível entre Eduardo e Mônica, perfeitamente descrito na música do Renato Russo? Lembra daquele sentimento que pairava no ar sem nenhuma sustentação? Acho que conheço uma história parecida, basta que se invertam os gêneros. Imagine um Eduardo que é como a Mônica de Eduardo e Mônica. Agora pense em uma Mônica que não tem absolutamente nada a ver com a Mônica de Eduardo e Mônica, mas sim com o Eduardo. Entendeu? O fato é que o Eduardo e a Mônica da minha história, assim como o Eduardo e a Mônica de Renato Russo, não tem nada a ver um com o outro. Eu vou te contar.

O Eduardo usa camisetas de bandas de rock, conhece uma porção de músicas cult que apenas 1% da população escuta e, como se não bastasse, ainda toca contrabaixo. Enquanto isso, a Mônica canta alegremente as músicas do Luan Santana que tocam na Liberdade FM e não desliga o rádio enquanto não acaba o refrão.

O Eduardo sabe tudo sobre química, assiste ao National Geographic e é capaz de recitar a história do Brasil, mesmo que lhe peguem desprevenido. A Mônica tem cara de líder de “clube da luluzinha”. Ela compra, mensalmente, a revista Capricho e vive atenta às últimas tendências da moda e às cores da estação.

O Eduardo fala inglês fluentemente e, se bobear, até arrisca em italiano. A Mônica confunde ditongos com hiatos e não faz a menor ideia do que seja um agente da passiva. Ele acreditava na teoria da relatividade; ela, no horóscopo do jornal. 

Ele prestaria Biomedicina no final do ano, moraria em uma república com outros mil amigos, entenderia tudo sobre as moléculas orgânicas e inorgânicas e seria feliz assim. Enquanto isso, ela dizia pretender cursar Arquitetura ou Engenharia Civil. Só não sabia, de fato, a diferença entre os dois. Mas ela não seria menos feliz por isso.

Os amigos dele falavam coisas sobre a física moderna e a estequiometria. Juntos, discutiam a política, a politicagem e a politização. Pra ela, tudo era, no fundo, a mesma coisa. No auge das discussões sobre a desigualdade que assola a sociedade brasileira, ela soltava um comentário de três linhas sobre a nova novela das sete. E ninguém dizia mais nada.

“E mesmo com tudo diferente, veio mesmo, de repente
Uma vontade de se ver
E os dois se encontravam todo dia
E a vontade crescia, como tinha de ser”

E mesmo que Eduardo fosse água e Mônica fosse vinho, surgiu entre eles um amor bobinho feito flor que brota em asfalto quente e seco da avenida principal. O amor deles era flor de primavera com cheiro de pólen fora do jardim. Era feito amor de verão, nos trezentos e sessenta e cinco dias do ano.

Ela enrolava os dedos nos cabelos lisos e loiros com olhos de pureza e malícia, ao mesmo tempo. E ele encarava os olhos dela, como se, pra cada segundo, pudesse fazer uma poesia. O amor deles era assim, subjetivo como as tantas figuras de linguagem que a Mônica não sabia como diferenciar. Era metonímia. Era soneto sem rima, drama sem falas, frase sem pontuação. 

“E todo mundo diz que ele completa ela
E vice-versa, que nem feijão com arroz”

E assim eu me pergunto quem é, de fato, feliz nesse mundo: quem rima ou quem perde a razão?

“E quem irá dizer
Que não existe razão?”