sábado, 2 de novembro de 2013

NOSSO DUPLO X E O DITO CUJO XY


No século passado, duro mesmo era ser macho. É, isso mesmo. Macho que era macho tinha a obrigação de honrar as calças. E honrar as calças incluía chegar junto na hora certa. Ah, o mito do macho sedutor! Mas macho que prestasse mesmo também ligava no dia seguinte. A menos, é claro, que a moçoila não valesse a pena. Nesse caso, era coisa de uma noite só. Porque, obviamente, algumas moças eram pra casar, e outras apenas pra passar o tempo. Acredite: a vagabunda sempre existiu, em qualquer momento da história, até mesmo no tempo da sua avó.

Falando em vó, na época da dita cuja esses machos – coitados – tinham uma lista de obrigações que, se não cumpridas, deixariam a família bastante preocupada. Machos perdiam a virgindade em zonas, levados por seus próprios pais. Machos colecionavam mulheres e as famílias diziam: “Prenda a sua cabrita, porque o meu bode está solto!”. Bom mesmo era o macho reprodutor, sexo forte, pegador.

Mas, antes que nos empolgássemos com a virilidade do sexo forte, já alertavam nossas mães e amigas do peito: há dois tipos de macho, o bonzinho e o cafajeste. É óbvio que o cafajeste é o que tem a melhor pegada, as costas mais largas e a mão mais viril. Mas cafajeste é também – para a nossa tristeza – aquele que fica com várias na mesma noite, que te faz mil promessas e depois desaparece, que não te inclui nos planos para o próximo fim de semana. É aquele que chega tarde do trabalho, joga uma pelada com os amigos no sábado, bebe cerveja e chama as mulheres que passam na rua de gostosas. É aquele que não te apresenta à família e não sabe ser gentil com o seu pai. Infelizmente, o pobre cafajeste não nasceu perfeito: seu braços fortes te enlouquecem, mas não te protegem. Você, moça indefesa, deve evitar essa espécie de macho, porque – é claro – tudo o que mais quer é, no fundo, ser protegida, certo?

Nessa época, moça boa procurava macho que não avançasse o sinal vermelho e se colocasse à disposição para ir em casa conversar com seus pais, ou seja, o bonzinho. O cara bonzinho era aquele que não fazia o coração acelerar, mas que estava sempre ali. Aquele que sempre atendia o telefone. Aquele que não aparecia misteriosamente na segunda-feira depois de um fim de semana inteiro de sumiço. Aquele com quem você – moça boa – constituiria uma família e criaria a prole.

Por sorte, amiga, os tempos mudaram. Hoje em dia a mulher não é vagabunda por não querer nada para além de uma noite. Hoje em dia o macho que te enlouquece também pode te proteger. Ou você, independente e segura de si, pode nem sequer querer ser protegida. Você pode.

Por sorte deles, cada vez menos recai sobre as costas dos nossos queridos a obrigação de ser o pegador, embora algumas famílias ainda sonhem com um filho másculo e associem o típico macho-pegador-cafajeste com um ideal de masculinidade.  Como prova da evolução das espécies, machos não precisam mais ser tão machos e fêmeas não precisam mais se comportar como presas indefesas que sonham em entrar de branco na igreja.

Fêmeas podem ser meio machos. Uma mulher autônoma em pleno século XXI pode ser mais macho que muito homem. Fêmeas podem optar por uma kitnet, um gato e um notebook. Machos podem chorar e ler poesia em dias chuvosos. Uma mulher pode chegar em um cara e um cara pode dar o fora em uma menina, sem que a primeira seja a vagabunda e o segundo um homossexual. E, se for esse o caso, qual o problema? Não somos mais as meras reprodutoras. Dividimos a conta, dirigimos, consertamos o chuveiro. Eles não mais os super-machos. Eles podem chorar, podem não querer transar no primeiro encontro, podem aprender a dar banho nas crianças e fazer o almoço no domingo.

Caminhamos – eu creio – rumo a uma sociedade sem papeis de gênero tão demarcados, em que homens e mulheres nascem para amar a quem quiserem e ser felizes como quiserem. Não é que estamos mesmo evoluindo?