quarta-feira, 9 de julho de 2014

COMO EXPLICAR PARA O SEU FILHO A DERROTA DE ONTEM

Hoje vi muita gente preocupada em como explicar para as crianças a triste derrota do Brasil na semifinal de ontem. Sei que é doído ver uma criança que até ontem balançava a bandeira e tocava a corneta pela casa chorar pelo fim de um sonho. Sei que machuca ver as lágrimas escorrendo nos rostinhos pintados com tinta guache. Mas precisamos assumir que as crianças têm ainda pouca dimensão do que é uma derrota, cabendo a nós, adultos, mostrar a elas que perder uma copa está muito longe de ser o fim do mundo. Aliás, talvez a copa seja uma oportunidade para apresentar às crianças exemplos palpáveis do que é a vida e de qual a maneira mais bonita e corajosa de enfrentá-la.

A você, que tem essa dúvida de como explicar para o seu filho o que foi a goleada de ontem, sugiro que comece dizendo que a frustração da derrota ainda terá que ser sentida e suportada por nós em inúmeras outras ocasiões, que o mundo ainda vai moer nossos sonhos dezenas de vezes e que as pessoas e fatos não operam de acordo com nossas vontades e expectativas. A vida é exatamente assim, não? Uma sucessão de perdas e ganhos que muitas vezes vêm em momentos que não poderíamos prever.

Eu diria também que o jogo de ontem é um ótimo exemplo dos fatores que conduzem a uma vitória limpa e merecida: preparo, dedicação, coragem e, é claro, o famoso “na hora certa e no lugar certo”. Quanto antes compreendermos isso, mais preparados estaremos para marcar o gol quando chegar a hora certa e quando a vida nos conduzir aos lugares certos.

Em seguida, sugiro que você diga que, muito antes do futebol, há inúmeras outras questões que fazem o sucesso ou o fracasso de um país, e que se o dia de ontem foi um “vexame histórico”, a história do Brasil com certeza pode nos mostrar diversos outros vexames bem mais vergonhosos, e que contra esses episódios sim nós deveríamos nos revoltar. Depois, sugiro que você explique para a sua criança que nossos sentimentos de orgulho e vergonha têm que ser menos frágeis e inconstantes, que perder não é necessariamente vergonhoso, que ganhar não é a única coisa que importa, e que o nosso patriotismo não deve estar à mercê de uma vitória na Copa do Mundo. Por favor, não deixe seu filho odiar a camisa amarela, jogar fora o álbum de figurinhas ou repetir que coisas assim “só acontecem no Brasil” só porque a seleção perdeu ontem. Diga a ele que o David Luiz, o Tiago Silva e tantos outros não deixaram de ser admiráveis do dia para a noite e que ser fã do Neymar ainda é permitido. Diga a ele com muita convicção que o Brasil não precisa ser o país do futebol para sempre, que morar aqui não se tornou melhor ou pior de ontem para hoje, que nosso orgulho e nossa honra não podem estar apoiados no que, antes de mais nada, é um esporte.

Por último, eu proponho que você diga ao seu filho que todas essas pessoas que machucam outros torcedores, incendeiam ônibus e depredam o patrimônio público imbuídas pela revolta do fracasso são o exemplo claro de como não se deve agir diante de uma frustração, e que talvez essas pessoas não tenham tido a chance de ouvir tudo isso de seus pais. E, para finalizar, espero que você saiba dar o exemplo ao seu filho de como lidar com situações que não vão de encontro ao que gostaríamos: com tristeza, sim, afinal sempre será nosso direito sentir a dor, mas também com respeito, resignação e – por que não? – docilidade.